A fraude e o seu impacto financeiro no país (caso de Angola)

A fraude e o seu impacto financeiro no país (caso de Angola)

Andrea Moreno Andrea Moreno
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A fraude e o seu impacto financeiro no país (caso de Angola)

Bem sabemos que as fraudes são tão antigas como o próprio conceito de negócios, e existem em todas as partes, afetam todas as indústrias, em todos os lugares do mundo, desde países muito desenvolvidos aos que estão em vias de desenvolvimento.

No entanto, não basta somente dizer que existem fraudes, mas sim atender ao conhecimento sistematizado para poder caracterizar as tipologias, o modus operandi do fraudador e, sobretudo, o impacto que as mesmas podem gerar, primeiramente nas organizações e, consequentemente, na economia das nações.

Sistematizar e conhecer a tipologia de fraudes mais suscetíveis de ocorrer tem vantagens, entre as quais:

  1. Conhecer quais as prevalências de ocorrência das mesmas;

  2. Como podemos conceber controlos internos e externos para evitar a sua ocorrência;

  3. Conhecer os custos reais derivados destas.

A ACFE (Association of Certified Fraud Examiners), - com sede nos Estados Unidos, é a maior entidade no estudo da Fraude, que congrega mais de 100 mil profissionais em todo o mundo -, estima que as fraudes consomem 5% da faturação das organizações.

Chegados aqui, com esta informação contrastada, devemos analisar o caso concreto de Angola, qual a prevalência e tipologia de fraudes. 

A ACFE definiu e estruturou aquilo que conhecemos como ‘Árvore da Fraude’, que é uma sistematização de todos os tipos de fraudes internas que podem ocorrer em cada organização. O número é assustador! Podemos ter mais de 200 tipologias de fraudes numa empresa, variando este número a maior de acordo com o negócio ou indústria.

A grande dificuldade reside no facto de, por desconhecimento, os gestores não investem em profissionais especializados anti-fraude, e carecemos por isso de conhecimento sobre  quais as prevalências da fraude e qual o modus operandi do fraudador.

Uma questão é certa: todas as possibilidades de fraude estão devidamente mapeadas por especialistas, normalmente um Examinador Certificado de Fraudes (CFE, na sigla em inglês) é capaz de identificar com alto grau de segurança, como é que ocorreu, se houve necessidade de conluio e entre que funções, e quais os controles internos que falharam ou precisam de ser implementados.

Por força do hábito, costumamos generalizar as tipologias, como por exemplo na questão da Fraude por Corrupção. 

Corrupção é uma definição completamente genérica, em substância consiste no ato de dar ou receber promessa ou dádiva irregular para sí, terceiros ou por interposta pessoa. Mas dentro da ampla questão da corrupção, -que sem dúvida é um mal que nos assola desde antes da idade média -, existe uma quantidade imensa de actos ilícitos que devemos analisar para poder “atacar” o problema.

Na análise da corrupção, por exemplo, podemos encontrar diversos tipos de conflitos de interesse, mais de 30 tipos de fraudes em contratos públicos, conluio entre agentes públicos, extorsão, gratificações ilícitas (as que são pagas em agradecimento por um ato lícito e devido realizado), a corrupção em comércio, os jogos de planilhas em conluio nos contratos de execução, etc… um sem fim de atividades ilícitas que caem dentro de uma categoria única chamada ‘corrupção’ mas, que se não forem individualizadas, categorizadas e examinadas separadamente, não se conseguem combater. 

E é justamente este o desafio que temos hoje no programa da luta contra a corrupção: “o bosque não nos deixa ver as árvores”. E isto, infelizmente, é uma falha comum nos Programas de Combate à Corrupção em quase todos os países,  do qual não estamos isentos.

Como CFE (Certified Fraud Examiner), e especialista em exames de fraude, recomendo que se realize um levantamento exaustivo das tipologias das fraudes, pois cada uma tem um modus operandi determinado e já amplamente estudado. 

Apenas e só com um correto mapeamento da fraude poderemos estabelecer procedimentos operacionais padronizados, porque os fraudadores não inventam nada, repetem os mesmos planos de execução de fraudes da mesma forma, seja aqui ou em outros países.  É curioso, e ao contrário do que se diz, o factor cultural não possui grande relevância neste sentido.

Como exemplo prático de exame de uma fraude bastante comum, usemos o caso dos ‘funcionários-fantasma’:

Classificação da Fraude: Fraude por Desvio de Activos;

Característica da Fraude: Fraude em Conluio, pois é pouco provável ocorrer em solitário, já que as funções de RH e Financeiro estão normalmente separadas. 

Participantes necessários: Gestor de Recursos Humanos e Financeiro.

Modus Operandi: O gestor de pessoal cria um funcionário fictício com dados bancários reais de um terceiro que é beneficiado. O Financeiro valida o pagamento e pode vir a ocultar do pagamento de INSS ou outros impostos.

Pelo exemplo, concluímos que é fundamental conhecer a forma de execução da fraude, pois ajuda-nos a estabelecer os controlos internos adequados.

Em Angola, a grandes rasgos, as questões de fraude encontram-se descentralizadas, entre os três grandes grupos de fraude: fraudes por corrupção; fraudes por desvio de activos e as fraudes contabilísticas. Cabe-nos a nós, profissionais anti-fraude, realizar a devida caracterização do evento de análise, de forma a que possamos ter medidas de prevenção, contenção estatísticas fiáveis de custos financeiros das fraudes, já que uma fraude em média, ocorre durante 18 meses até ser descoberta.

Por outro lado, as cifras ocultas da fraude também possuem um grande impacto, que actualmente é desconhecido, pois a grande maioria das empresas não divulga (nem internamente) as suas fraudes por medo dos danos reputacionais, com a falsa sensação que ao manter oculta a fraude dá a impressão de que o controle interno é robusto e que assim não diminui a confiança das suas partes interessadas. Aqui, encontramos uma problemática adicional, pois, caso exista responsabilização do fraudador, que normalmente é descartado por acordo de despedimento e eventualmente por processos disciplinares, normalmente estas “maçãs podres” não são denunciadas, e por conseguinte não sendo penalmente responsabilizados, daí que as estatísticas apontem que apenas 1% dos fraudadores têm antecedentes penais, e soma e segue, a história volta a repetir-se.

Artigo origjnalmente publicado no jornal Expansão de Angola pela autora.


Andrea Moreno

Certified Fraud Examiner - CFE

Diretora PetroShore Compliance

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